Do recado, uma história de amor

A irmã mais velha pediu a outra, imediatamente mais nova [eram muitas] que dissesse ao rapaz da outra cidade, que, no Natal, vinha a Itabaiana, e, com ela trocava olhares, que não queria mais namorá-lo. O rapaz, da outra cidade, precisamente, de Frei Paulo, não se abalou. Achou a mensageira mais bonita e por ela se empolgou, em silêncio, porque, à época, era assim mesmo.

Meses depois, no sítio da mensageira, chegou o tio dele, do rapaz, num domingo à tarde, para conversar com o pai [da mensageira]. Conversa lá, conversa cá, o pai da mensageira perguntou, afinal, o que desejava. E o tio esclareceu que, em nome do sobrinho, filho de sua irmã, dona fulana de tal, cidadão de Frei Paulo, fazendeiro, estava ali para pedir a mão de sua filha em casamento. O pai da mensageira, cheio de filha em casa [só duas tinham casado, até então], perguntou qual delas. O tio não soube responder. Negócio não realizado. O pai da mensageira recusou-se a dar a mão de uma filha em casamento sem saber qual era. Não fechou o negócio. Deixou-o em suspenso. O tio do pretenso noivo voltaria depois com o nome dela, porque, também, não sabia.

No mesmo dia, foram reunidas todas, em fila, sem se saber quem seria a escolhida. A mensageira pode ter sentido alguma coisa no ar. Era a mãe, que, informada pelo marido, buscava saber qual a filha estava sendo pedida em casamento. Nada. Algumas semanas depois, tudo se resolveu. O rapaz de Frei Paulo teve seu pedido aceito. Alguns outros meses passaram-se, o rapaz de Frei Paulo, já noivo, casou-se e levou a mensageira para a sua terra, ali pertinho de Itabaiana. Quatro filhos. Viveram felizes o tempo que o destino aos dois reservou.

Depois de quatro filhos e um neto, precisamente, uma neta, ele morreu, de uma doença que vinha lhe derrubando há algum tempo Três meses depois ela, silenciosamente, com desculpa de problema de coração, encontrou motivo para seguir o mesmo caminho dele. Morreu também. De saudade, talvez, foi tão seguinte a morte da viúva que dava para desconfiar. Não ficou, ela, a morta, na mesma sepultura do marido, porque o tempo ainda não permitia. Passou a ser sua vizinha, tão perto, separados apenas por uma parede, fácil de ser ultrapassada pela alma/espírito. Devem estar felizes, juntos, outra vez, enfim, agora, sob o abraço da eternidade.

A história parece tirada das páginas de um livro. Mas é verdadeira. Ocorreu. É real e concreta. Posso dar meu testemunho. Numa época em que a moça casava com quinze ou dezesseis anos, os pedidos de casamento, muitas vezes, antecediam o namoro. Na família em tela o número de mulheres atingia exatamente a casa de nove.  A mensageira de ontem, esposa depois, morta por fim, era minha tia, irmã de minha mãe. 

O registro feito é para homenagear uma bonita convivência, fruto de uma história de amor nascido de um recado dado numa feirinha de Natal, há muitos anos, em uma cidade sergipana chamada de Itabaiana.