Dificuldade de aprendizagem: Como detectá-las?

A criança não aprende como os outros. Ela tem é “preguiça” ou será um caso de dificuldade de aprendizagem que deve ser levado a sério? Que profissional pode auxiliá-la no processo de aprendizagem?


Pare. Imagine. Uma criança pequena quer pegar um determinado objeto em cima de uma mesa e não está conseguindo. Agora pense! Como os pais devem agir? Devem auxiliá-lo, facilitando seu trabalho ou deve estimulá-lo a vencer obstáculos? Que atitudes são mais positivas e eficazes no processo de aprendizagem dessa criança?


Consideremos que a aprendizagem é um processo de construção que ocorre na interação do sujeito com o meio, ou seja, é preciso que o sujeito interaja com situações que o provoquem e vivencie essas experiências para que tome conhecimento do mundo, para que efetivamente aprenda. Nessa interação, a criança constrói experimenta  construir e desconstruir aprendizagens.  Quando essa aprendizagem não ocorre é porque algo não vai bem com o sujeito. Isso é percebido pelos familiares, no caso de crianças menores, ou pelo próprio indivíduo ou por profissionais no caso de crianças mais crescidas.


 Os pais são os primeiros “ensinantes” de uma criança e nos quais ela confia, ou seja, são aqueles que lhe transmitem significações, a partir das quais se constrói a matriz organizadora de posteriores aprendizagens. Assim, uma criança pequena que está aprendendo a andar é estimulada pelos pais a circular pela casa e encontra um obstáculo, uma elevação mínima que possa fazê-la perder o equilíbrio, certamente essa criança desconstrói a imagem construída de um espaço plano para construir a imagem de um espaço que pode fazê-la cair e isso é comumente reforçado pelos pais que a alerta sempre que há um desvio no chão por onde a criança passa.


Desse modo, é com os pais que as crianças vão descobrindo o mundo, aprendendo a internalizar (ou não) os valores transmitidos por eles. Assim, a forma de aprender dessa criança é construída, a princípio, no ambiente familiar, no contato com seus pais.


Voltemos ao exemplo da criança que não consegue pegar o objeto sobre a mesa. Alguns pais preocupados em ver seu filho tendo dificuldades (quem sabe a primeira experiência de frustação da criança, através da qual reorganizará seu esquema mental para uma nova aprendizagem) ou por medo de que ela venha a se machucar intervêm nesse momento pegando o objeto e entregando na mão dessa criança. Os pais, nesse momento, interferem de modo negativo no processo de aprendizagem dessa criança e esta, por sua vez, vai ficando acomodada esperando que todo e qualquer conhecimento chegue até ela, tornando-se um sujeito passivo nesse processo.  Com isso a criança não ganha autonomia, e vários aspectos cognitivos, afetivos e comportamentais começam a ser prejudicados.


São nessas primeiras experiências vivenciadas no seio familiar que é definida a forma de aprender de cada criança. Assim, quando ela entra em contato com a instituição escolar, já traz consigo a sua maneira de aprender, ou sua modalidade de aprendizagem, edificada no seu primordial ambiente de vivência. E a depender dessa modalidade, podem surgir dificuldades de aprendizagem, muitas vezes erroneamente confundidas com “preguiça”. Considerando o exposto até aqui, cabe então questionar: o que leva um sujeito apresentar dificuldades de aprendizagem?


As dificuldades de aprendizagem são apresentadas em função de uma situação orgânica ou psicológica que envolve desde a memorização, concentração, atenção e o armazenamento de informação por parte da criança. De modo mais específico, as dificuldades orgânicas são aquelas advindas de transtornos, síndromes, déficits e até dificuldades na maturidade perceptiva auditiva e visual. Já as psicológicas são aquelas que surgem de um trauma, de estresses emocionais sofridos ou vivenciados pelo indivíduo. Além disso, dificuldades de aprendizagem podem decorrer de técnicas, métodos ou ações pedagógicas inadequadas.


Quando a criança apresenta um baixo rendimento escolar não atingindo ou correspondendo às expectativas determinadas pelas requisições do ensino ministrado nas intuições, isso deve ser visto como um sinal de alerta, ou seja, o professor deve sinalizar para os pais ou responsáveis a atual situação desse aluno, encaminhando-o para o profissional habilitado. Neste momento é de suma importância não se perder tempo procurando um culpado, mas sim reunir e buscar meios para sanar as dificuldades encontradas, procurando orientação psicopedagógica. O psicopedagogo é o profissional que tem como objeto de estudo a aprendizagem, ou seja, é o profissional que lida com as dificuldades de aprendizagem de um indivíduo. É ele quem tem os instrumentos necessários para identificar as causas dessas dificuldades e intervir através de ações pontuais, especialmente, através do lúdico, para reorientar o caminho do aprender de cada indivíduo que o procure.  No entanto, não se deve esquecer do papel importantíssimo do professor que, detectando a dificuldade, pode auxiliar esse aluno no processo de aprendizagem, primeiro, não o rotulando e segundo, reorientando atividades de aprendizagem que lhe deem a oportunidade de descobrir o seu potencial.


Então, como os pais e professores podem detectar se determinada criança está com dificuldade de aprendizagem?


Algumas características evidenciam dificuldades de aprendizagem. Em relação ao aspecto cognitivo a criança pode apresentar dificuldade em aprender cores; falha na identificação das letras e seus sons; apresenta dispersão; mostra-se desatenta; troca constante as letras; tem dificuldades para memorizar músicas, fórmulas e tabuada; demonstra pouca objetividade na resolução de problemas simples; tem dificuldade em atividades de coordenação, como cobrir pontinhos, pintar, desenhar; e, ainda, apresenta lentidão para realizar os deveres de casa e desorganização do material escolar.


Há ainda as características que poderão ser observadas em crianças com dificuldade de aprendizagem em relação ao aspecto emocional e comportamental.  A criança que apresenta baixa autoestima (ou seja, tem pouca ou nenhuma confiança em si mesma) desvaloriza-se como também desvaloriza o que produz; não apresenta autonomia; desiste com facilidade, quando surge um obstáculo para a realização de uma tarefa; frustra-se com facilidade; isola-se; e possui um elevado nível de ansiedade.


Caso a família ou os profissionais da escola detectem algumas dessas características na criança, deve evitar o senso comum em torno do mito da “preguiça” e procurar orientação profissional especializada para, através de um trabalho individualizado, buscar as causas dessas dificuldades, a fim de que sejam traçadas intervenções psicopedagógicas, visando sanar as dificuldades apontadas. É importante destacar que não se pode entender um processo de aprendizagem analisando somente o “aprendente” sem recorrer ao “ensinante”, muito menos diagnosticar um problema de aprendizagem sem recorrer à instituição escolar, pois, no diagnóstico de um problema, é necessário analisar o todo, atentando para os diversos fatores que intervêm no processo de ensino-aprendizagem.


Durante todo o processo de diagnóstico do sujeito, feito pelo terapeuta, as hipóteses do “não-aprender” ou o aprender com dificuldades vão sendo levantadas e irão sendo confirmadas ou não, havendo a suspeita ou confirmação de um desvio de aprendizagem. Com isso, o psicopedagogo identificará os possíveis problemas, com análises que englobam os diferentes aspectos que interferem no processo de aprendizagem, com o intuito de reelaborá-lo e ajudar a desenvolver no sujeito o prazer de aprender, propiciando condições para que ele se enxergue como sujeito-autor de sua produção e desenvolva sua autonomia. Somente assim, esse indivíduo conseguirá restaurar o vínculo estabelecido, enquanto sujeito, com o objeto de conhecimento.