Destaque do Mês

Emicida - AmarElo

Em um ano de tantas turbulências, de tantos acontecimentos que abalam a confiança e as perspectivas do brasileiro Emicida vem com seu mais novo álbum, que é um antídoto contra todo o pessimismo, medo, violência e outras forças negativas que nos paralisam e nos sufocam diante das dificuldades. AmarElo é um alento, uma mão estendida, uma luz. Emicida mantém a contundência e a força na hora de falar das questões sociais que o Brasil enfrenta, mas também preza pelo equilíbrio mental e espiritual e olha com empatia e amor ao próximo, longe das polarizações e extremismos que ressoam tão forte nos últimos anos. Já no início, em “Principia”, ele traz um canto de fé e espiritualidade, mas sem as amarras dogmáticas de uma determinada religião, e sim, tirando o que há de melhor de cada visão, unindo assim, polos que parecem ser opostos como o gospel e o candomblé. E ainda com as palavras certeiras e carregadas de lucidez do pastor Henrique Vieira e a contribuição da sambista Fabiana Cozza. Há também canções que resgatam os prazeres e significados da vida como “A ordem natural das Coisas”, “Pequenas alegrias da vida adulta” e “Quem tem um amigo tem tudo”. O olhar sob o cenário social brasileiro vem com força em “Paisagem”, “9nha”, Ismália, Eminência Parda (com as participações de Larissa luz e Fernanda Montenegro) e Libre. A faixa-título AmarElo (com participação de Majur e Pabllo Vittar) traz a essência de todo o álbum e arremata todo o poder das mensagens através dos versos como “Permita que eu fale, não as minhas cicatrizes / Se isso é sobre vivência, me resumir a sobrevivência / É roubar o pouco de bom que vivi.”

Elza Soares - Planeta Fome

Em seu terceiro álbum desde o poderoso ressurgimento através do já clássico, “A Mulher do Fim do Mundo”, passando pelo igualmente genial, “Deus é Mulher”, Elza Soares põe o dedo na ferida de um país que se vê obrigado a encarar de frente carências antigas e reascende as perguntas feitas originalmente pelos Titãs: “Você tem fome de quê? Você tem sede de quê?”, “Planeta fome”, título inspirado na famosa passagem da Vida de Elza em que dava o ponta pé inicial na carreira como caloura no programa de rádio de Ary Barroso, é um desabafo e um chamado à luta contra todas as mazelas que assolam o Brasil e estão ainda mais evidentes nos últimos tempos em que a ignorância e o ódio insistem em dar o tom do debate. A abertura é grito de resistência de “Libertação” entonado pelo verso “Eu não vou sucumbir” e a generosa contribuição do Baiana System. Em “Blá Blá Blá”, com participação de Bnegão e Pedro Loureiro, os versos imortalizados por Tim Maia em “Me dê Motivo” são usados pra declarar que ir embora não é solução, Elza quer ficar e resistir. Um dos momentos mais impactantes do álbum é a interpretação de “Comportamento Geral”, composta por Gonzaguinha nos tempos da ditadura militar e ressignificada em um momento no qual o autoritarismo volta a ameaçar a democracia. O passado também é invocado em “pequena memória para um tempo sem memória” e as provocações continuam em “Não tá mais de graça” uma resposta a outro clássico de Elza, “A carne”, invocando a valorização e força da população negra brasileira. Planeta fome vem como um grito que ecoa em todos que continuam na luta incessante para construir o que é descrito em “País dos Sonhos” e toda essa força é sintetizada na figura da própria Elza Soares.